CARTA DO PAI DO ESTUDANTE DE MEDICINA ASSASSINADOPELA POLICIA MILITAR PARA OS DEUSES: “PERDI, PERDI….”

Oh Deuses da Criação!
Deixa cantar os versos deste triste imortal,
Hoje exatamente passou-se eternos 365 dias,
Imersão na dor dilacerante, na solidão, na angustia,
Como um Prometeu acorrentado contemporâneo,
Que cada manha é acordado,
Com o tormento do fígado consumido pela águia,
Ao lembrar como arrancaram meu caçula sem poder salvá-lo,
Para no dia seguinte repetir o mesmo suplicio uma e outra vez…
Soube desde minha infância de grandes homens que vocês salvaram seus filhos
mais amados, até nos últimos instantes, mas eu não fui dessa estirpe…
Que fogo de conhecimento eu pode ter levado aos homens para merecer tal
castigo?…ou que tamanha maldade eu posso ter feito para merecer esta tragédia…?
Oh Deuses que podem tudo!
Porque não abateram a maldade no coração desses dois Policias Militares nesse
momento, e colocarem uma nuvem de paz em torno deles?
Porque vocês não evitaram que esses criminosos covardemente um pegue a arma
em punho e o outro ataque meu garoto chutando na barriga?
Porque não desviaram a bala disparada a queima roupa pelo Policia Militar
assassino para evitar pegar órgãos nobres?
Porque vocês não permitiram que levassem rapidamente ao hospital próximo e
equipada para dar uma chance de salvar ele?
Porque permitiram que ao eu ser alertado e correr com o taxi não poder chegar
minutos antes ao local para eu mesmo ter contido o sangramento do meu filho?
Porque esses policiais covardes não deram informações imediatas para avisar
aos cirurgiões e poder salvar meu caçula?
Porque vocês, com a sua mágica e poder, não aceitaram a oferenda de joelhos da
minha vida pela do meu filho na porta da sala de operações?
Eu somente queria de vocês uma chance.
Vida toda foi abençoado por vocês, em cada triunfo, em cada título, em cada
ação por uma causa. Estudei, procurei e lutei uma humanidade melhor, porque me
cobraram e tiraram tudo de uma vez?
Oh Deuses!
Me juntei com o coração partido, a outras pobres famílias no Inferno
atormentados pela dor e saudades do filho amado e a humilhação da impunidade dos
assassinos. Nossas lagrimas e gritos subiram ao céu e devem ter acordado até aos anjos.
Mas não seria suficiente morrer naquele dia, morreria uma vez mais e outra
mais…com a ausência de justiça contra os assassinos e cumplicidade dos protetores: a
delegada da polícia, os bombeiros, o comandante da polícia, a juíza, o promotor, os
desembargadores, o secretário de segurança, o governador, numa longa lista que alguém
poderá fazer um Museu de Cera mais terrorífico que aquele do Madame Tussauds.
Grandioso Brasil cadê teus homens corajosos e justos?
Na luta incansável por justiça, tragicomédias encenadas nas investigações e nas
cortes judiciais que um dia a História as tornará sátira e comedia.
Oh Deuses!
Tal vez não estarei para ver isso …desde aqui não. Muitas coisas a conversar no
Final dos meus tempos teremos.
“Não tenho amanhã” se tornou o princípio que norteou a minha existência. Em
cada um dos dias passados, Marco Aurélio, vindo das estrelas, me acompanhou nas
epistolas escritas, encarando as mais altas autoridades, marchando nas ruas com o punho
levantado, viajando para outros continentes em busca de justiça. Marco Aurélio secou as
minhas lagrimas e me deu folego na minha solidão e silencio.
Oh Deuses, vocês estão certos:
“Perdi, perdi…”
Se ainda tiver amanhã, tal vez possa pegar o único que Pandora deixou na caixa
que abriu naquele fatídico 20/11/2024 …
Construir uma máquina do tempo…
O poder de viajar até as estrelas…
Vila Mariana, São Paulo, 20 de novembro de 2025
Dr. Julio C. Acosta Navarro, PhD
Professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo