O Brasil, enquanto Estado laico, tem por dever garantir o respeito e a igualdade entre as diferentes expressões de fé presentes em nosso território. Entretanto, percebe-se uma lacuna na aplicação efetiva da Lei de Intolerância Religiosa (Lei nº 7.716/1989), especialmente em situações que envolvem o reconhecimento de sacramentos realizados por igrejas não pertencentes à Igreja Católica Apostólica Romana.
Gostaria de destacar dois exemplos emblemáticos que demonstram essa desigualdade:
- Reconhecimento de Sacramentos
Os sacramentos realizados pela Igreja Católica Apostólica Romana (como batismo e matrimônio) são amplamente aceitos por outras instituições, religiosas ou civis, sem questionamentos. Contudo, sacramentos realizados por outras denominações cristãs, como a Igreja Católica Apostólica Brasileira, igrejas ortodoxas ou anglicanas, frequentemente enfrentam desconfiança e descrédito.
Exemplo disso ocorre quando uma pessoa batizada há décadas em uma Igreja Católica Nacional decide contrair matrimônio e, ao solicitar suas fichas sacramentais, é confrontada com a rejeição de seu batismo anterior. Muitas vezes, o agente pastoral, padre ou até mesmo o bispo da Igreja Católica Romana declara o sacramento inválido, afirmando que a pessoa viveu uma fé “morta” ou “não verdadeira”. Isso resulta não apenas em humilhação para a pessoa, mas também em desrespeito à dignidade da igreja que realizou o sacramento.
- Preconceito contra Denominações Minoritárias
Quando sacramentos são desqualificados dessa forma, não apenas a fé do indivíduo é atacada, mas também a honra e a legitimidade da igreja que realizou o sacramento. Ao declarar publicamente que um sacramento “não valeu”, a igreja é rotulada como “falsa”, o que configura difamação e intolerância religiosa.
Proposta de Medidas
Para assegurar que a Lei de Intolerância Religiosa seja verdadeiramente praticada e que todas as expressões de fé sejam respeitadas, solicito que o Ministério da Justiça avalie e implemente as seguintes medidas:
- Reconhecimento Igualitário de Sacramentos
Normatizar o reconhecimento civil e religioso de sacramentos realizados por igrejas que possuem estatuto jurídico e histórico de legitimidade no Brasil, independentemente de sua filiação a denominações majoritárias. - Combate à Intolerância por Meio de Educação
Promover campanhas educativas que incentivem o respeito mútuo entre as denominações cristãs e outras religiões, esclarecendo o papel das igrejas independentes e minoritárias na construção da diversidade religiosa brasileira. - Apoio Jurídico para Igrejas e Fiéis
Garantir que igrejas e fiéis que sofram discriminação possam recorrer à Justiça, com apoio jurídico para lidar com casos de difamação ou humilhação pública. - Revisão da Legislação
Avaliar a possibilidade de atualizar a legislação vigente para incluir penalidades específicas para casos de desrespeito interdenominacional que configurem intolerância religiosa.
Este artigo não busca confrontar ou deslegitimar qualquer denominação religiosa, mas sim promover o diálogo, o respeito e a justiça para todas as expressões de fé que fazem parte do rico mosaico religioso brasileiro.
Assinado,
Dom Frei Lucas Macieira da Silva
Jornalista Social, Teólogo, Escritor, e Arcebispo da Diocese Anglicana Católica do Brasil
Materia envida pela Assessoria de Comunicação da Diocese Anglicana Catolica do Brasil