Hoje, estive em dois lugares onde as orações não são apenas palavras, mas gritos da alma. Não foi numa igreja, nem numa catedral, tampouco num santuário repleto de velas e imagens. Os dois espaços que mais clamam ao céu são, paradoxalmente, os que mais revelam a fragilidade e a esperança humana: o cemitério e o hospital.
O Cemitério: Campo da Saudade
Pela manhã, acompanhei a despedida de uma grande mulher, minha amiga Altheid, de 94 anos. Uma matriarca que dedicou sua vida a criar e educar seus filhos. No Campo Santo, Cemitério da Paz, ela foi plantada como uma semente no coração da eternidade.
Ali, entre lágrimas e soluços, ouvi as orações de uma família dilacerada pela ausência. Alguém poderia dizer: “tristeza”. Mas não, não é tristeza: é saudade, essa presença misteriosa que se instala quando a ausência grita. O cemitério não é apenas terra e lápides; é um templo a céu aberto, onde cada túmulo carrega uma prece suspensa.
O Hospital: Templo da Esperança
À tarde, meus passos me levaram ao Hospital São Lucas, em Santa Efigênia. Lá, encontrei um amigo advogado, outrora pai e marido presente, hoje esquecido pelos filhos e abandonado no leito da velhice não planejada.
Ali, vi corpos debilitados, mas também uma chama de esperança que insiste em brilhar. Enfermos rezando para voltar para casa; mães pedindo um dia a mais; velhos suplicando apenas por companhia. No hospital, as orações não são bem estruturadas nem decoradas: são sinceras, urgentes, rasgadas.
Dois Altares Invisíveis
No cemitério, os vivos falam aos mortos na esperança de que Deus escute.
No hospital, os vivos falam a Deus na esperança de não se tornarem mortos.
São dois altares invisíveis, mas poderosos. Ambos nos lembram que a oração verdadeira não precisa de vitrais, mas de verdade.
Hoje, ouvi as mais sinceras orações.
E entendi que os lugares que mais se roga a Deus não têm púlpitos nem coros, mas lágrimas e suspiros.
Dom Lucas Macieira da Silva-Arcebispo Primaz da Diocese Anglicana Católica do Brasil-Jornalista Social e escritor