A validade sacramental na ordem é um tema central para a compreensão da autenticidade das ordenações nas igrejas nacionais e associações apostólicas. Apesar de muitas dessas comunidades não estarem em comunhão formal com Roma, sua capacidade de conferir sacramentos válidos, especialmente no que tange ao ministério da ordem (diaconato, presbiterado e episcopado), é amplamente discutida e fundamentada em critérios teológicos, históricos e canônicos.
—
1. A Validade Sacramental e Seus Critérios
A validade sacramental de uma ordenação é definida pela presença de três elementos essenciais:
1. Matéria: A imposição das mãos.
2. Forma: As palavras da oração consecratória, que expressam claramente a intenção de conferir a ordem.
3. Intenção: A intenção de fazer o que a Igreja faz, ou seja, continuar o ministério apostólico.
Desde que esses elementos estejam presentes e realizados por um bispo validamente ordenado, a ordenação é válida, independentemente da jurisdição institucional ou da submissão a Roma.
—
2. Fundamentos Bíblicos e Teológicos da Ordem
A Escritura e a Tradição fornecem as bases para a compreensão do sacramento da ordem.
João 20:21-23: “Assim como o Pai me enviou, eu também vos envio.” Com estas palavras, Jesus confere aos Apóstolos a missão de continuar seu ministério.
Atos 6:1-6: A escolha dos sete primeiros diáconos, que receberam a imposição das mãos, reflete a prática inicial da ordenação.
Hebreus 7:17: “Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque.” Esse texto reforça o caráter eterno e indelével do sacerdócio.
Teologicamente, a sucessão apostólica é o elo que garante a continuidade da missão de Cristo por meio da Igreja, sendo essencial para a validade sacramental.
—
3. Ordenações nas Igrejas Nacionais
As igrejas nacionais, muitas vezes separadas da jurisdição romana, têm desempenhado um papel significativo na preservação da sucessão apostólica e na conferência de ordens válidas.
a) Igrejas Ortodoxas e Vetero-Católicas
Essas igrejas são amplamente reconhecidas por Roma como portadoras de sucessão apostólica e sacramentos válidos. Embora estejam fora da comunhão formal, sua doutrina e prática asseguram a continuidade com a tradição apostólica.
b) Comunhões Anglicanas e Igrejas Independentes
Embora as ordenações anglicanas tenham sido contestadas historicamente por Roma (cf. Apostolicae Curae), muitas igrejas anglicanas e nacionais independentes restauraram ou mantiveram a sucessão apostólica por meio de consagrações episcopais válidas.
c) Associações Apostólicas Livres
Comunidades como a Comunhão Anglicana Livre e outras igrejas nacionais independentes têm se esforçado para preservar a validade sacramental, realizando ordenações em conformidade com os critérios teológicos e históricos.
—
4. A Reflexão Teológica sobre a Validade
A validade das ordenações nas igrejas nacionais não depende exclusivamente da submissão a Roma, mas da fidelidade à sucessão apostólica e à tradição sacramental.
Concílio de Niceia (325): Reafirmou que a sucessão apostólica é o critério fundamental para a validade das ordenações.
Concílio de Trento (1545-1563): Reforçou a importância da forma, matéria e intenção para a validade dos sacramentos.
Unitatis Redintegratio (1964): Reconheceu a validade dos sacramentos das igrejas orientais separadas.
Esses documentos mostram que a sucessão apostólica é um princípio universal e não exclusivo da Igreja Romana.
—
5. O Sacerdócio Segundo a Ordem de Melquisedeque
A frase “sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque” (Hebreus 7:17) é central para compreender a validade do sacramento da ordem. Ela enfatiza que:
1. O sacerdócio é eterno e imprime um caráter indelével.
2. A imposição das mãos e a oração consecratória conferem esse dom de maneira definitiva, independentemente da jurisdição eclesiástica.
3. A autoridade para conferir ordens é garantida pela sucessão apostólica, não por um vínculo administrativo com Roma.
—
6. Conclusão
As igrejas nacionais e associações apostólicas têm desempenhado um papel importante na preservação da sucessão apostólica e na conferência de ordens válidas. A validade sacramental não depende exclusivamente da comunhão com Roma, mas da fidelidade à sucessão apostólica, à doutrina e aos critérios sacramentais estabelecidos pela tradição da Igreja.
Por meio dessas práticas, elas continuam a perpetuar o sacerdócio eterno de Cristo, segundo a ordem de Melquisedeque, garantindo a autenticidade de sua missão e a eficácia de seus sacramentos.
Dom Frei Lucas Macieira da Silva
Teólogo, Bispo Anglicano, Escritor e Jornalista Social